quarta-feira, 27 de junho de 2007

LEMBRANÇAS DA SAUDOSA MANCHETE

Por Joannes Lemos
Neste mês de Junho, a TV Manchete completaria 24 anos se ainda estivesse no ar. A emissora foi inaugurada em 1983, e encerrou suas transmissões no dia 19 de maio de 1999, dando lugar à bagunçada RedeTV!, de Amílcare Dalevo Júnior. Infelizmente, todos nós perdemos muito com a ausência da Rede Manchete, que foi à falência por causa da má administração a que foi submetida, principalmente depois da morte de seu fundador, Adolpho Bloch, que, certamente, também não teve pulso firme para administrar sua rede de televisão.
Entre 1986 e 1991, a Manchete foi considerada a segunda maior rede de televisão do Brasil e a terceira maior potência televisiva da América Latina. Durante os 16 anos em que permaneceu no ar, a tv da família Bloch ofereceu ao público brasileiro uma grade de programação diversificada e de boa qualidade. Entre seus produtos estavam as telenovelas, umas de sucesso, e outras que não fizeram muita diferença, mas que deram aos telespectadores a chance de acompanhar obras da teledramaturgia nacional que não fossem apenas da Rede Globo. Entre as novelas se destacaram: Dona Beija, Kananga do Japão, Xica da Silva e o estrondoso sucesso Pantanal, que usando e abusando de cenas de nudez e erotismo, conseguiu bater a audiência da Globo no horário nobre por sucessivas vezes, ultrapassando com frequência a casa dos 40 pontos de audiência. Uma façanha fora dos domínios da arquipoderosa Globo. Esse feito nunca foi repetido posteriormente pela Manchete.
E quando se fala no nome Manchete, fica difícil não lembrar também dos seriados japoneses. Entre eles os mais memoráveis são os inesquecíveis Jaspion, Changeman e Flashman, não deixando de citar o êxito do desenho Cavaleiros do Zodíaco. Muitos podem dizer que eram programas com baixa qualidade técnica, que os monstros eram mal produzidos, mas nada disso é capaz de nos fazer esquecer, com muita saudade, daquela magia que só as crianças – no caso nós- sentíamos ao olhar em ação aqueles bonecos com suas coreografias mirabolantes.
Vistoso também era o jornalismo da emissora, sempre sério e imparcial. O carro-chefe do canal sempre foi o Jornal da Manchete, que esteve na programação desde o primeiro até o último dia. Em s
eus primeiros tempos, o Jornal da Manchete ficava no ar por até três horas. Vários grandes nomes do jornalismo brasileiro passaram por este telejornal, na função de comentaristas, como Carlos Chagas(atualmente no SBT Brasil) e João Saldanha. Outros programas jornalísticos também tiveram certo sucesso, como o Câmera Manchete e o Na Rota do Crime, que alavancaram a audiência e o faturamento da empresa por algum tempo.
ENTRANDO EM DECLÍNIO
Mas, a partir de 1991, a Manchete entrou em uma grave crise econômica, e a causa mais conhecida para a complicação financeira seria o alto investimento na novela Amazônia, produto que a emissora lançou com a intenção de pegar carona no mega-sucesso Pantanal, e que acabou não resultando em grandes benefícios para o canal devido a baixa audiência. Aliado a isso, a rede acumulou uma grande dívida trabalhista e atrasos nos pagamentos dos funcionários, resultando num montante que só aumentava a cada ano. As crises pioraram com as greves dos funcionários da emissora, que chegaram a tirar o canal do ar. No final de 2005, tive a oportunidade de entrevistar o jornalista capixaba Xerxes Gusmão (In Memorian) para um trabalho da faculdade. Xerxes foi por alguns anos diretor nacional de vendas da TV Manchete, e na ocasião disse que um dos erros iniciais da Manchete foi lançar uma programação ‘Classe A’, com programas de gosto refinado, que eram sucesso de crítica mas, em alguns casos, fracasso de público, já que os telespectadores da tv aberta no Brasil são atraídos por programas mais populares. Isso também teria feito a emissora acumular dívidas já no início de sua trajetória, surtindo efeito por toda sua existência.
Em 1996, o canal lançou a novela Xica da Silva, com a primeira protagonista negra da teledramaturgia brasileira, vivida pela estreante Thaís Araújo. Os índices da novela foram satisfatórios para os padrões da emissora, mas não a ponto de apagar o incêndio financeiro. As novelas que vieram em seguida viram seus índices despencarem, e a dívida da empresa com funcionários e fornecedores ultrapassava os R$ 30 milhões. Com a promessa de ter sua concessão cassada, a solução encontrada foi vender as cinco concessões da emissora, que passaram para as mãos do empresário Amilcare Dalevo, dando origem à RedeTV!.
Hoje, o que resta da extinta Manchete são as lembranças de um tempo áureo, majestoso e inesquecível. O imponente prédio-sede da emissora no Rio de Janeiro, projetado por Oscar Niemeyer, irá a leilão. Está avaliado em R$ 42 milhões, e o valor da venda será usado para pagar dívidas, que não deixaram de existir com a extinção do canal. Mas, com certeza, a maior das lembranças é o logotipo do canal: o M de Manchete, um M de memórias, boas memórias.