quinta-feira, 17 de julho de 2008

UM PASSO À FRENTE, DOIS PASSOS PARA TRÁS


Por Joannes Lemos

"A novela é o espelho mágico dos brasileiros. Reflete a nossa realidade." Assim disse o novelista Lauro César Muniz, autor de grandes sucessos como ‘O Salvador da Pátria’, ‘Roda de Fogo’, ‘Espelho Mágico’ e ‘O Casarão’. Mas parece que algumas emissoras não estão dando importância para a célebre frase do autor. Talvez nem conheçam a sentença. Quem pode explicar isso melhor é a Rede Record de Televisão. Segundo o jornal O Globo, a atual vice-líder de audiência entre as TV’s abertas assinou contrato com o grupo mexicano Televisa. É isso mesmo: em pouco tempo, teremos dramalhões mexicanos à moda brasileira no canal dos bispos.
A Record teria chegado a um acordo com a Rede Televisa, onde produzirá novelas com textos mexicanos, mas não vai exibir as produções de lá. Pelo menos por enquanto. Mesmo assim, isso significa um grande retrocesso, num país repleto de bons autores e com grande tradição na produção de boas telenovelas. A nova aposta da Record não é inédita na história da nossa televisão. Em 1964 a prática já existia, quando a saudosa Ivani Ribeiro escreveu dois grandes sucessos: A moça que veio de longe, adaptação de um texto argentino; e Alma Cigana, adaptada de um texto cubano. Ambas foram escritas para a extinta TV Excelsior. O primeiro sucesso estrondoso da teledramaturgia nacional, O Direito de Nascer, exibida em 1965 pela Tupi, também era uma adaptação de texto cubano.
Não pense que a toda poderosa Vênus Platinada TV Globo ficou longe dos dramalhões latinos. Na segunda metade dos anos 60 a emissora carioca contratou a novelista cubana Glória Magadan, tida como uma grande conhecedora dos enigmas que poderiam transformar uma novela em fenômeno absoluto. Porém, as novelas de Glória não tinham compromisso nenhum com a realidade brasileira. Seus enredos – super-produções para os padrões da época – se passavam na corte francesa, no Marrocos, no Japão e em outros cantos do mundo. Seus personagens centrais eram rainhas, duques e condes. Algumas novelas de sucesso de Glória foram O Sheik de Agadir, A Rainha Louca e Eu Compro Esta Mulher. Em 1967 a Globo contrata Janete Clair, que se transforma numa espécie de pupila de Glória Magadan. Percebendo a necessidade de criar um produto que tivesse mais a cara do brasileiro, Janete passa a produzir textos mais condizentes com a nossa realidade. A partir daí, a Globo rompe com Glória, e as novelas, mais realistas, ganham ares de brasilidade.
Outro exemplo de emissora que aderiu aos dramalhões latinos foi o SBT, obviamente. Desde a inauguração da emissora, em 1981, o canal de Silvio Santos exibia novelas latinas, principalmente mexicanas. Apesar de estar totalmente fora de nossa realidade, algumas merecem destaque, como Maria do Bairro, A Usurpadora, e é claro, Carrossel, que tirou preciosos pontos do Jornal Nacional na época em que foi ao ar. As novelas mexicanas são boas para os mexicanos, que se identificam com esse produto. Mas não prestam um grande serviço aos brasileiros. Diversão as nossas já oferecem. A partir de 2001, o SBT, em uma parceria inédita da emissora com a Televisa, passou a produzir os textos mexicanos em seus estúdios de São Paulo, além de continuar exibindo as histórias enjoativas de antes. A cada ano que se passava a audiência das produções mexicanas do canal do Chaves definhava cada vez mais, e a sociedade foi interrompida em 2007, quando foi ao ar Amigas & Rivais, a última novela da dobradinha SBT-Televisa.
É aí que está o ponto mais curioso da recente parceria Record-Televisa: se isso não estava dando certo no SBT, que agora está em 3º lugar no ranking geral da audiência – e isso em parte se deve a debilidade das novelas mexicanas – por que então a emissora da Barra Funda teve a idéia de trazer de volta algo que até o pacato SBT rejeitou? Com tantos autores de qualidade em nosso país, talvez não fosse a melhor solução do momento para a emissora que quer chegar a liderança adaptar textos de gosto duvidoso. Vamos combinar que as atuais novelas da Record não são nenhuma maravilha. São uma das piores depois da retomada de produção própria do canal (em termos de conteúdo, já que a audiência, em contraponto, está boa para os padrões da emissora). Os Mutantes praticamente não tem texto, assim como a recém-lançada Chamas da Vida. Ambas se apóiam aos efeitos especiais (nem tão especiais assim) para chamar a atenção. É claro que a vice-líder produziu bons folhetins, como a nova versão de A Escrava Isaura, de Tiago Santiago, Essas Mulheres, de Marcílio Moraes, e Cidadão Brasileiro, do já citado Lauro César Muniz.
Se com a nova empreitada a Record quer chamar a atenção, talvez vá conseguir. Difícil ainda é saber se dará certo, o que significa ter boa audiência. Possivelmente, a emissora fará uma novela em que uma mocinha super-chorosa ganha superpoderes e salva a Terra, ou então uma empregada doméstica muito pobre encontra sua irmã gêmea muito rica e descobre que eram siamesas quando crianças. O nome da primeira poderia ser ‘Lágrimas de Amor’, e da segunda ‘Maria de Sangue’. Brincadeiras à parte, a decisão da Record pode ser um grande equívoco, em um momento decisivo para a emissora. Não custava nada colocar no ar um terceiro horário de novelas água com açúcar, mas ao estilo brasileiro. Afinal, ninguém sabe fazer novela melhor do que nós, sejam elas com mutantes ou não.

4 comentários:

Anônimo disse...

Querido, seu texto como sempre está ótimo, apenas acho q vc foi muito parcial o q para um jornalista não é bom, veja as coisas com imparcialidade, não é pq no sbt não deu certo q na record não vai dar, não vamos fazer apostas precipitadas, ninguém acreditava q a record chegaria onde está e cá estamos nós, em televisão tudo é possível.

Helena Vitória disse...

Meu querido jornalista. Por que não se especializa em um pesquisador do tema? O sucesso seria mais do que garantido. Concordo contigo quando diz que temos autores bons no Brasil para darem conta de produções novelísticas. Mas a Record quer ousar, ainda que correndo perigo. Vamos preparar os lenços para acompanhar as novas tramas da emissora.

Anônimo disse...

Joannes, meu caro amigo, tenho que te confessar que esse foi um dos seus melhores textos que já li no seu blog. Caramba! Vc fez muito bem seu dever de casa antes de vir escrever pra gente sobre novelas, assunto esse, que diga-se de passagem, parece ser sua especialidade. Foi por isso que o texto ficou tão bom? hehehehe. Mas eu concordo com a nossa amiga Josi num ponto: Jornalista precisa ser impacial, digo, precisa tomar cuidado sobre o que publica, afinal, o alvo de hoje pode seu lugar de emprego amanhã. Com relação à teledramaturgia mexicana, concordo plenamente contigo que a brasileira é muito superior. Mas enfim, seu texto está EXCELENTE! Parabéns!
Um abração!
Bruno.

Anônimo disse...

é, nao dá mesmo pra entender!!!
potencial nao falta pra record, mas parece q ta faltando forca de vontade...