segunda-feira, 27 de abril de 2009

SEGREGAÇÃO À MODA BRASILEIRA


Por Joannes Lemos
A história já é conhecida por outros exemplos, quando em outras partes do mundo pessoas se viram separadas por meio de um gigante paredão de concreto. Berlim e Palestina tiveram seus muros, que, sabe-se muito bem, vieram com o único propósito de segregar. Os futuros muros das favelas cariocas, porém, vieram teoricamente com outros propósitos, que é o de conter o avanço das moradias (maneira mais educada de se referir aos paupérrimos barracos) sobre as encostas e áreas de preservação ambiental.

A iniciativa para a construção dos muros partiu do governo do Estado do Rio de Janeiro. Inicialmente estão nos planos a construção de muros para cercar 11 favelas da zona sul da capital carioca. Segundo pesquisas recentes do Instituto Datafolha, a opinião dos moradores está dividida, tanto daqueles que moram nos morros quanto daqueles que moram no “asfalto”. Nas favelas – de acordo com os números e considerando a margem de erro de quatro pontos percentuais da pesquisa – 47% é a favor e 46% é contra a construção dos muros. Nos círculos nobres que cercam os morros, onde moram famílias de classes mais elevadas, os números também mostram um racha nas opiniões, com 44% a favor e 46% contra.

Em um dos locais onde haverá muros, no morro Dona Marta, existe quem é contra e quem é a favor. Alguns moradores se queixaram aos institutos de pesquisa alegando que a construção do paredão não foi proposta, e sim imposta pelo Estado. Se estamos em um estado democrático e a população do local não foi ouvida, então talvez os moradores do Dona Marta fazem parte de um estado aristocrático. Se o estado está realmente impondo os muros na zona sul carioca fica quase implícito o uso da força por parte da administração do governador Sérgio Cabral. Não a força bruta, mas uma força “fria”, aquela que estabelece que as regras são impostas pelo estado e que não é possível burlá-las.

A construção dos muros em morros do Rio de Janeiro repercutiu tanto que até intelectuais de fora do país criticaram a obra, como o escritor português José Saramago, que protestou em seu blog. Simbolicamente a obra realmente causa impacto. Os turistas que visitarem a cidade maravilhosa terão um novo cartão-postal para compor suas fotos, que serão as Grandes Muralhas do Morro. Causa choque também o valor desprendido para por de pé o projeto: R$ 40 milhões para erguer 11 quilômetros de paredões com três metros de altura – se não for desviado nenhum tostão.

Talvez o pequeno grande detalhe da altura do muro é o que está criando o imbróglio. Se o objetivo é apenas o de impedir que a população avance sobre áreas de proteção, por que então algo tão alto? Em outras favelas cariocas, como no Vidigal, o projeto Favela-Bairro também construiu muretas para servirem como limites identificáveis, mas que medem apenas 30 centímetros de altura. Além do mais, o Instituto Pereira Passos fez um levantamento e concluiu que todas as comunidades escolhidas para a construção do muro cresceram em área menos do que outros bairros. Ou seja, a população desses locais não é alienada a ponto de arriscar a vida de suas famílias construindo em terreno que pode oferecer risco aos demais.

É por essas e outras que muitos cidadãos acreditam que a função do muro – escondida nas intenções do governo – seria a de criar uma barreira para o poder paralelo que toma conta dos morros cariocas. Se a intenção do estado é realmente reprimir os bandidos dessas áreas há métodos mais eficientes, como oferecer emprego, educação e melhores condições de vida para quem já é discriminado por ser favelado. Erguer muros não vai diminuir a violência do asfalto, mesmo porque o foco dos altos índices de violência do Rio não são apenas as favelas. Levantando muros o estado cria mais uma barreira contra a população discriminada dos morros, enquanto o aceitável seria trazê-la para o seu seio.

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